Escreva para professorpaulolangaro@yahoo.com.br e deixe a sua crítica ou sugestão...

sexta-feira, 23 de julho de 2010

A Trilha Para o Conhecimento, Investigação, Curiosidade, Surpresa, Postura Filosófica...

A natureza nos proveu com um corpo pequeno e fraco, mas com uma razoável inteligência. Essa inteligência vem garantindo a sobrevivência da nossa espécie já por um bom tempo. De que forma?

Com o desenvolvimento dos sentidos, da memória, da capacidade de comparar e separar aquilo que é semelhante e aquilo que é distinto e, finalmente, com a habilidade de se comunicar e selecionar informação, a raça humana conseguiu organizar-se em sociedades, grandes ou pequenas, para melhorar suas chances de realizar tarefas difíceis como as que envolvem a agricultura, a caça, a edificação de casas, a confecção de roupas, a manufatura de ferramentas e instrumentos, a construção de máquinas e a elaboração de teorias e modelos etc.

Todos estes elementos nos proporcionam uma enorme e perigosa vantagem com relação aos outros seres vivos do planeta. Perigosa, porque essa vantagem é tão grande que corremos o risco de, embriagados por ela, não perceber que podemos ser, nós mesmos, o alvo de nossos venenos, armas, máquinas etc. Mas, apesar desse perigo, a inteligência continua sendo a nossa arma de sobrevivência neste mundo. Como caracterizá-la então?

Pelo que notamos, não podemos definir a inteligência somente como a capacidade de perceber, memorizar, separar e comunicar. A inteligência deve ser algo ainda maior. A inteligência deve nos prover com a capacidade de perceber o que se esconde por trás das aparências temporais das coisas. A inteligência deve permitir que nós nos admiremos com nós mesmos!

Criamos padrões para facilitar a nossa vida. Padrões são formas que se repetem e que nos garantem uma certa estabilidade num mundo caótico. Esta estabilidade é o que nos garante aquele meio termo entre o distinto e o mesmo, para que brote a informação. Podemos notar padrões como os hábitos alimentares, as maneiras de vestir, a língua de cada país, as maneiras de pensar de cada época etc.

Sem estes padrões viveríamos num caos onde, a cada novo dia, tudo seria diferente do dia anterior. Não conseguiríamos saber o que comer, o que vestir, o que falar e nem mesmo o que pensar, pois tudo mudaria sempre. Uma vez que estes padrões, a seu tempo, se estabelecem, nos tranqüilizamos e já podemos ir dormir calmamente em nossas camas. Na medida em que sabemos, mais ou menos, o que nos espera na manhã seguinte.

Contudo, conforme os padrões sociais vão se solidificando e se estabilizando, fica muito fácil, para nós, mantermos as coisas sempre muito parecidas durante o passar do tempo. Mantemos o mesmo emprego, fazemos sempre o mesmo caminho para a escola, usamos os mesmos modelos de roupas, os mesmos tipos de sapatos, gostamos do nosso velho carro, não gostamos de comer comidas muito exóticas, não tentamos um novo amor, nem um novo penteado.

Nos poupamos das novidades e envelhecemos sem muitas surpresas. Simplesmente repetimos sempre a mesma coisa, todo dia, indefinidamente. Assim, pensamos que tudo estará bem. Tal forma de pensar e de agir é tão sedutora que muitas pessoas caem nessa armadilha e suas vidas se tornam bastante monótonas e arriscadas. Arriscadas porque elas não estão preparadas para mudanças bruscas no ambiente - como guerras, perder os empregos, crises econômicas, crises conjugais ou amorosas, acidentes com seqüelas etc.

Mas dissemos, há pouco, que a inteligência deve ser capaz de se admirar consigo mesma. Deste modo, definimos inteligência pela capacidade peculiar de nos mantermos vivos ainda que situações muito adversas nos cerquem. Portanto, surpreender-se com o que não é óbvio, isto é, com o que se esconde por trás de outras coisas, é tão necessário à vida quanto é se alimentar, se vestir e muitas outras coisas. Além de perceber, memorizar, comparar e comunicar, também precisamos nos espantar para sermos considerados seres inteligentes e criativos.

Para esse espanto acontecer, precisamos, em primeiro lugar, observar o óbvio e tentar enxergar para além dele. Se espantar com as coisas rotineiras, isto é, se admirar com o que nos cerca no dia-a-dia é o que permite uma melhor preparação para situações inusitadas, mas absolutamente possíveis. O tamanho de nossa criatividade, que é a capacidade de sobrevivermos de maneira não monótona, pode ser verificado na quantidade de vezes com que nos espantamos com o que chamamos de “comum” ou de “corriqueiro”.

Desta habilidade de se espantar com as coisas cotidianas surgem momentos mágicos e muito valiosos para toda a espécie humana, como é o caso dos momentos inventivos dos grandes cientistas ou daquelas horas inspiradas dos grandes artistas, como os compositores, os pintores, os poetas e os escultores. Por exemplo: tomemos um padrão simples, como uma chaleira. Alguém nos pede para fazer algo com ela.

Muito bem. Então, olho para ela e penso em um delicioso chá. Encho-a de água e preparo o meu chá. Se, por outro lado, pedíssemos o mesmo para um artista, como Hermeto Pascoal, por exemplo, ele talvez quisesse fazer algo mais original, menos óbvio do que chá com a chaleira.

Talvez, ele pegasse a chaleira e começasse a soprar em seu bico para fazer algum tipo de som. Pablo Picasso pintou diversas mulheres, e a cada novo quadro se podia perceber menos uma mulher e mais uma outra figura qualquer, retorcida, fragmentada, deslocada, reposta.

Ser original, ou criativo, portanto, é saber encontrar novas posições ou funções para objetos comuns, reinventando suas formas e utilidades. Contudo, isto só é possível na medida em que assumimos um ponto de vista novo, diferente, não usual. A adoção deste novo ponto de vista, por sua vez, só é possível quando nos espantamos e nos propomos perguntas do tipo: Mas por que isto é assim? Por que as coisas devem ser assim ou ter esta ou aquela função? Como poderia fazer diferente? Como seria um mundo diferente? Como viver uma vida diferente da que eu vivi até hoje? Como e por que isto ocorre desta maneira? Quando estas perguntas começam a aparecer com alguma freqüência em nossas mentes, é porque estamos adotando o ponto de vista daquele que não está satisfeito, daquele que pede uma explicação, daquele que quer saber o como e o porquê das coisas. Este ponto de vista é também conhecido como Ponto de Vista Crítico ou Ponto de Vista Filosófico.

Sem este ponto de vista crítico ou filosófico, muitas perguntas como estas não teriam sido formuladas em muitos momentos. Deste modo, muitas invenções, teorias, quadros, poesias, pinturas, músicas, esculturas não teriam existido. Se existe uma postura filosófica no sujeito que percebe as coisas comuns, então, existe um olhar crítico. Se existe um olhar crítico, então, há a percepção do novo. E, se o novo aparece, é porque as coisas estão mudando.

Mundo de Sofia:

Muitas pessoas têm hobbies diferentes. Algumas colecionam moedas e selos antigos, outras gostam de trabalhos manuais, outras, ainda, dedicam quase todo o seu tempo livre a uma determinada modalidade de esporte.

Também há os que gostam de ler. Mas os tipos de leitura também são muito diferentes. Alguns lêem apenas jornais ou gibis, outros gostam de romances, outros ainda preferem livros sobre temas diversos, como astronomia, a vida dos animais ou as novas descobertas da tecnologia.

Se me interesso por cavalos ou pedras preciosas, não posso querer que todos os outros tenham o mesmo interesse. Se fico grudado na televisão assistindo a todas as transmissões de esporte, tenho que aceitar que outras pessoas achem o esporte uma chatice. (...)

Qual é a coisa mais importante da vida? Se fazemos esta pergunta a uma pessoa de um país assolado pela fome, a resposta será: a comida. Se fazemos a mesma pergunta a quem está morrendo de frio, então a resposta será: calor. E, quando perguntarmos a alguém que se sente sozinho e desolado, então certa-mente a resposta será: a companhia de outras pessoas.

Mas, uma vez satisfeitas todas essas necessidades, será que ainda resta alguma coisa de que todo mundo precise? Os filósofos acham que sim. Eles acham que o ser humano não vive apenas de pão. É claro que todo mundo precisa comer. E precisa também de amor e cuidado. Mas ainda há uma coisa de que todos nós precisamos. Nós temos a necessidade de descobrir quem somos e por que vivemos.

O Melhor meio de se aproximar da filosofia é fazer perguntas filosóficas: Como o mundo foi criado? Será que existe uma vontade ou um sentido por detrás do que ocorre? Há vida depois da morte? Como podemos responder estas perguntas? E, principalmente: como devemos viver? Essas perguntas têm sido feitas pelas pessoas de todas as épocas. Não conhecemos nenhuma cultura que não se tenha perguntado quem é o ser humano e de onde veio o mundo. Basicamente, não há muitas perguntas filosóficas para se fazer. Já fizemos algumas das mais importantes. Mas a história nos mostra diferentes respostas para cada uma dessas perguntas que estamos fazendo. É mais fácil, portanto, fazer perguntas filosóficas do que respondê-las.

                                                                                                           (Jostein Gaarder, O mundo de Sofia)
O que é "Comum"?

Naquela época nós sempre tínhamos em casa duas ou três galinhas ciscando no quintal. Você acha que a galinha é uma coisa comum? Bem, eu também achava. Mas isso foi antes de conhecer Mika. Imagine que você fosse um astronauta solitário atravessando o espaço sideral. Mesmo que você viajasse durante meia eternidade, só com muita sorte encontraria uma galinha — uma só que fosse!

Há bilhões de estrelas no universo. Uma ou outra pode ter um ou dois planetas girando à sua volta. Depois de viajar muitos e muitos anos, você poderia chegar a um planeta onde existisse vida. Mas mesmo num planeta com vida, as chances de encontrar uma galinha são mínimas. Seria mais provável você encontrar um ovo. Mas duvido muito que desse ovo saísse uma galinha.

É bem possível que não existam galinhas em nenhum outro lugar do universo exceto no nosso planeta Terra. E o universo é tão vasto que nem dá para imaginar! Sendo assim, como podemos dizer que a galinha é comum?

                                                                                              (Jostein Gaarder, Ei! Tem alguém aí?)

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Colabore com o Blog Registrando a sua opinião!