Uma vez que os seres humanos iniciaram sua vida em grupo, descobriram necessidade da comunicação. Os graus de comunicação aumentam ou diminuem de acordo com a competência dos participantes deste processo, que se assemelha muito a um jogo. Na medida em que são bem sucedidos, isto é, na medida em que estes participantes do processo de comunicação (o Emissor e o Receptor) estabelecem contato por meio de sinais, se verifica o quanto de informação pode aparecer.
Podemos dizer que quanto mais informação houver no processo de comunicação maiores serão os benefícios mútuos que poderão advir. A informação que se apreende, por sua vez, é mais ou menos como uma habilidade de se perceber (apreender, compreender, perceber) algo que é um meio termo entre o absolutamente novo, isto é, o que nunca se viu antes, e a repetição absoluta, isto é, o idêntico.
Para que haja informação, é necessário, em primeiro lugar, um Sujeito que é capaz de perceber o sinal. Por sua vez, o sinal dever ser arranjado de tal maneira que nem seja algo que nunca se viu antes nem seja algo absolutamente monótono. As palavras cumprem este fim de maneira bastante satisfatória, pois não mudam muito de forma e, no entanto, podem ser arranjadas entre si de infinitas novas maneiras.
Sendo assim, os humanos descobriram que a linguagem, a articulação dos sinais com a finalidade da comunicação, encontra a sua forma quase que definitiva no discurso. Este é, de maneira simples, a ordenação das palavras de acordo com regras.
Conforme os grupos iam se organizando e se distinguindo cada vez mais uns dos outros, suas palavras, seu discurso e sua linguagem também iam se desenvolvendo e se distinguindo entre si.
As línguas naturais dos povos - como o russo, o grego, o japonês, o português, o francês, o alemão, o inglês - não se distinguem apenas por letras ou por palavras diferentes. Nem tampouco são meros conjuntos de regras gramaticais mais ou menos complicados.
Cada uma destas línguas, e centenas de outras, são discursos diferentes. Cada uma delas são formas distintas de organizar os sinais. Estas línguas nasceram há muito tempo, formando, em torno de si, enormes grupos de pessoas no ato de comunicar.
Quando se aprende uma nova língua não se aprende apenas os nomes das coisas e das ações. Nem somente as regras para usar este ou aquele nome, esta ou aquela ação. Quando se aprende uma nova língua, deve-se ter em mente um novo tipo de pensamento, de organização cultural, de época. Deve-se ter em mente as tradições desse povo, seus hábitos, suas roupas, suas constituições físicas, suas leis, suas cidades, enfim, sua história.
A língua se forma junto com o povo. Muitas vezes, a língua confunde-se com o próprio povo. No Brasil, notamos isto nos famosos regionalismos, nos quais palavras e expressões inteiras são conhecidas somente em um ponto específico do território. É também muito fácil notarmos como a língua se confunde com a maneira de pensar de um determinado conjunto de pessoas quando dirigimos nossa atenção para os sotaques.
Jamais confundiríamos, por exemplo, o sotaque de alguém que viveu sua vida inteira no Rio Grande do Sul com o sotaque de alguém que nasceu em Pernambuco. Estes dois Estados brasileiros não estão separados apenas pela distância geográfica, de um para o outro tudo muda: os hábitos, as roupas, as comidas típicas, as festas etc. A língua, portanto, traduz verbalmente todas estas tradições e configura, ela mesma, uma enorme parcela desta identidade: mesmo assim, estes dois povos, o pernambucano e o gaúcho, se identificam na língua portuguesa. Colocados juntos, numa conversa, possivelmente, muita in-formação poderia brotar. Provavelmente, mais do que se colocássemos apenas dois gaúchos juntos, ou apenas dois pernambucanos, para conversar. A informação está neste intervalo entre o diferente e o mesmo.
De maneira mais radical podemos perceber isto nos países Europeus que possuem uma tradição histórica mais antiga que a nossa, que é oriunda, principalmente, da colonização portuguesa e da vinda dos escravos negros da África. Nestes países, principalmente os da Europa Oriental, existem pequenos povos que possuem raízes étnicas diferentes, ou seja, possuem origens, línguas e formações culturais distintas e que, mesmo assim, foram obrigados a se identificarem uns com os outros por motivos de organização política ditatorial.
Este é o caso da antiga Iugoslávia. País no qual povos como os Croatas e os Sérvios tiveram que abdicar de sua identidade cultural em prol de uma união nacional fictícia. O resultado foi uma reação violenta, culminando numa guerra com milhares de mortos. Os mesmos eventos violentos vêm ocorrendo há tempos na África, cujo território foi dominado e arbitrariamente dividido entre países como a Inglaterra, a França e a Alemanha. Assim, tribos, historicamente inimigas, foram obrigadas, mais uma vez, a viverem juntas e, de novo, as reações violentas. Também a China vem dominando o Tibet desde meados do século XX.
O Brasil também teve alguns encontros compulsórios de diferentes etnias, como os europeus, os indígenas e os africanos. E por causa disso muitos conflitos violentos tiveram vez no Brasil. A cultura indígena, seus cultos, suas tradições, sua culinária, sua língua, foram quase que totalmente suprimidos. O mesmo não aconteceu com o povo africano, que conseguiu, a duras penas, marcar presença na cultura brasileira por meio da religião e da língua.
A língua portuguesa, no Brasil, é fruto desta múltipla interação entre povos diferentes. Elementos de nossa cultura, portanto, como o futebol, a música, a religião, a culinária, o vestuário e a própria língua demonstram, no dia-a-dia, a grande quantidade de informação surgida desta mistura entre o diferente e o mesmo. Contudo, para que esta informação se concretize de fato, ainda continua sendo necessário um sujeito que perceba estes sinais na natureza.
“A religião, a culinária, o vestuário, o mobiliário, as formas de habitação, os hábitos à mesa, as cerimônias, o modo de relacionar-se com os mais velhos e os mais jovens, com os animais e com a terra, os utensílios, as técnicas, as instituições sociais (como a família) e políticas (como o Estado), os costumes diante da morte, a guerra, o trabalho, as ciências, a Filosofia, as artes, os jogos, as festas, os tribunais, as relações amorosas, as diferenças sexuais e étnicas, tudo isso constitui a Cultura como invenção da relação com o Outro.”
Os gregos, sob o ponto de vista racial, constituíam um produto híbrido. Alguns dos mais remotos habitantes da Grécia parecem ter falado uma língua muito diferente do grego. (...) Por vezes, certos pensadores baseiam em motivos raciais as realizações gregas ulteriores ou estabelecem o contraste entre as qualidades inatas da disciplina dórica e da versatilidade jônica. Isto, na melhor das hipóteses, traduz uma confusão entre raça e cultura; na pior, perversões como a do culto do homem nórdico.
A palavra ‘grego’ permite várias acepções, mas a expressão ‘civilização grega’ significa, vulgarmente, aquela civilização que começou na Idade do Ferro e atingiu o seu maior esplendor nos V e IV séculos a.C.. A nova civilização que surgiu nas terras gregas está na origem de todas as civilizações ocidentais modernas, mas para ela não foi ainda possível encontrar qualquer antepassado legítimo.
(R.M. Cook, Os Gregos)
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